terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

O FIM DA REELEIÇÃO



Oscarino Arantes

"Os partidos políticos existem para alcançar o poder." 
(Ulysses Guimarães)

Objetivamente, a razão de ser de um partido político é chegar ao poder. Todo o sentido de sua criação, todo o propósito de sua existência, sua organização e ação política, é voltada para esse objetivo. Pela via institucional numa democracia, a chegada ao poder, aqui compreendido como o governo central, ocorre por meio de eleição. Daí a importância fundamental da alternância democrática, ou princípio da alternância do poder. Isso porque, ao contrário do senso comum, a democracia não é apenas a vontade da maioria prevalecendo sobre a minoria. É também um conjunto de princípios e valores que ajudam a construir o referencial de uma ordem democrática: estado de direito, estabilidade das regras, respeito às minorias, livre manifestação de pensamento, divisão e autonomia dos poderes, entre outros.

É nesse sentido que faz parte da essência da própria democracia a alternância do poder, que permite um equilíbrio entre as forças políticas instaladas no governo e aquelas que lhe fazem oposição, contribuindo para a renovação política. Sem ela consolidam-se práticas autocráticas, personalismo, desvios éticos, a confusão entre partido e governo, o enfraquecimento da oposição, o esvaziamento do debate ideopolítico e o desprestígio da própria democracia.


Em um país com partidos fracos, práticas oligárquicas, população despolitizada e instituições em consolidação, a reeleição introduzida com a EC nº 16 de 04/06/1997 foi um aleijão em nossa democracia, alterando o equilíbrio entre situação e oposição. Esvaziou, por assim dizer, a fluência de uma perspectiva real de poder. Na época, na esteira da estabilização econômica do Plano Real, foram “vendidas” para a sociedade brasileira as idéias vinculadas de governabilidade e continuísmo, como fianças da estabilidade macroeconômica. Na verdade buscava-se afastar o elemento imponderável do processo eleitoral, dando-lhe previsibilidade, exigência dos “investidores”. Hoje, pagamos o preço do casuísmo de FHC.

Sem a reeleição, a eleição geral em quatro em quatro anos permitia a contínua retomada do projeto eleitoral partidário, com o aproveitamento da estrutura anterior, rearranjo de alianças, novas propostas e novos embates, numa dinâmica que, se não era perfeita, mantinha em aberto a possibilidade de aperfeiçoamento. Com a reeleição, esvaiu-se a perspectiva real de poder e o quadriênio passou a ser mero referendo do continuísmo. Acontece que o ciclo de oito anos é longo demais para manter alianças e propostas no campo da oposição. A base governista se amplia e absorve a oposição ou lhe esvazia. Para acomodar tantos partidos, o governo partilha a máquina do estado por critério quantitativo e o fisiologismo toma a linha de frente na política governista. Ao término do ciclo de oito anos, a relação de forças políticas está tão alterada que dificilmente a situação não conseguirá se perpetuar no poder. 

O fim da reeleição a meu ver é interesse fundamental de toda sociedade. Nota de fundo da atual crise de nossa democracia, a falência institucional dos partidos políticos não é causa, mas sim conseqüência de um sistema político que precisa ser reformado. Dilma chegou a falar do assunto quando assumiu o governo, mas depois abandonou a idéia e sequer esboçou uma tentativa de levar adiante a proposta de reforma política, conformando-se com o modelo governamental herdado. Ficará na História como a estudante que pegou em armas contra a ditadura e a presidente que não soube defender a democracia.


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