terça-feira, 1 de janeiro de 2013

A DEMOCRACIA EM XEQUE NA ERA LULA



Oscarino Arantes
“A solução democrática está na democracia radical, um movimento constante de socialização da vida pública, um fortalecimento da condição civil, humanizadora, solidária, do exercício democrático.” (Carlos Fuentes)
Subestimamos a democracia no Brasil. Costumamos confundi-la com o direito e a reduzi-la ao processo eleitoral. A história política de nosso país demonstra que tanto a direita, quanto a esquerda, em regra, mantiveram restrições, até ideológicas, aos valores democráticos. Tanto assim que, em nossos partidos políticos, células mater de nossas instituições, vigoram ainda hoje, modelos de autocracia e oligarquia que se perpetuam em suas direções e se reproduzem em todos os níveis partidários no chamado cartorialismo. O déficit democrático daí decorrente se estende até os mandatos eletivos e cargos políticos, gerando uma cultura de posse da ‘coisa pública’, que se manifesta nos esquemas de corrupção e perpetuação do poder. Essa carência de valores democráticos também se reproduz em todos os grupos e instituições da sociedade civil, onde é comum vermos seus dirigentes alterando estatutos, simulando assembléias ou manipulando quórum para manter o poder. O respeito às minorias, a estabilidade das regras e a alternância democrática, são princípios ignorados em quase todas as relações sócio-políticas em nosso país.
   
Mas o desapreço pelo ideal democrático em nosso país, parte também de uma visão deturpada de setores da esquerda, que relaciona a democracia com o aparato institucional. Talvez uma herança do lento processo de redemocratização iniciado ainda na ditadura militar. Acontece que deste modo concebida a democracia é percebida como uma concessão do Estado. Ao se sucederem as frustrações das pautas dos movimentos sociais, é comum o processo democrático ser prontamente desqualificado. Com isso o desgaste do nosso meio político institucional viciado torna-se o desgaste de nossa própria democracia.
   
Quem sabe por isso, ainda é preciso lutar pela democracia no Brasil de hoje, submerso na fábula do pensamento único, onde não se ausculta voz dissonante, nem se diferenciam os matizes ideológicos dos partidos políticos. Não há debate de idéias, nem confronto ideopolítico, tudo se resolve nos gabinetes do governismo, onde o ‘poder da caneta’ mantém o clientelismo e o patrimonialismo como pontas de uma corda esticada sobre um abismo, enquanto nossa democracia debilmente se equilibra. O continuísmo é celebrado como virtude e em nome de uma governabilidade é suprimido o dissenso. Assim a crise da democracia representativa tornou o ativismo do Poder Judiciário uma necessidade, que certamente aumenta nosso déficit democrático. Fala-se em ‘judicialização da política’, quando o verdadeiro problema é a politização do judiciário. Eleições são decididas antes das urnas por juízes muitas vezes comprometidos. Também não se deve perder de vista, que o estamento dominante se articula em todos os setores para aprimorar o controle das vias democráticas, aproveitando-se do estranhamento de nosso povo pela participação política e se justificando com um proeminente discurso ético-legalista. Como sempre e a história confirma, todo atentado à democracia se inicia com uma forte retórica de austeridade.
    
Foi desta forma, incorporando as piores práticas de nossa política, que o lulismo no poder cooptou os partidos e aparelhou os movimentos sociais, engessando-os num falso consensualismo sob um triunfalismo-ufanista, em estreita aliança com as oligarquias mais atrasadas do país e o capital financeiro. Usando de programas assistenciais e políticas compensatórias, Lula conquistou amplos bolsões de aderência eleitoral nas camadas mais pobres da sociedade. E é assim, que a era Lula está levando nossa democracia ao abismo sem corda de uma política despolitizada.

          

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