domingo, 4 de julho de 2010

O Brasil precisa de uma revolução na educação para entrar no século XXI


NOSSA CAUSA COMUM: O EDUCACIONISMO
Escola igual para todos
Cristovam Buarque
A proposta de utopia socialista sonhava com um mundo onde cada um “trabalharia de acordo com sua capacidade e ganharia de acordo com suas necessidades”. O socialismo no século XX errou ao não perceber que no século XIX qualquer um tinha emprego conforme sua capacidade natural, sem necessidade de formação, e errou ainda mais ao não perceber que as necessidades já não são limitadas, decorrem de uma ânsia consumista ilimitada. Daí o recurso, nos países socialistas, ao uso da ditadura, para reprimir as aspirações consumistas das classes médias.
No século XXI, a capacidade de cada um depende diretamente da formação do trabalhador, cada vez mais complexa e sofisticada, e as necessidades de cada um são cada vez maiores. No século XIX o operário tinha emprego sempre que houvesse crescimento econômico criando vagas em grande número. No século XXI o crescimento cria poucas vagas e estas sobram se o trabalhador não for qualificado. Porque para ter emprego, o operário tem que se transformar em operador.
A revolução de hoje está em assegurar o pleno desenvolvimento da capacidade de cada um, e permite-lhe que seja remunerado de acordo com esta capacidade, permitindo um consumo diferenciado. O “socialismo” no século XXI deve consistir em assegurar a todos igualdade no acesso à qualificação, permitir que todos tenham a mesma oportunidade educacional. Com isto, a liberdade permitirá desigualdade no consumo, acima da linha da exclusão e abaixo da linha da destruição ecológica. Ninguém consumindo menos do que o necessário para sair da pobreza e ninguém consumindo mais do que equilíbrio ecológico permite. No espaço entre o necessário - social e o possível - ecológico, a liberdade convive com a desigualdade.
Depois do fracasso de todos os “ismos” que baseavam a utopia nos sistemas econômicos nacionais, o educacionismo baseia a construção da utopia civilizatória na revolução educacional que assegure a mesma oportunidade de formação para todos. Esta é uma visão compatível com os novos tempos onde a globalização substitui as economias nacionais e onde o capital-conhecimento e as informações substituem ao capital-máquina como os vetores do progresso; onde o computador substitui a máquina a vapor, a escola substitui a fábrica. Onde os operários se transformam em operadores e a luta de classes é substituída pelo choque de interesses entre os que têm e os que não têm formação profissional e educacional e por esta razão a sociedade é dividida entre incluídos e excluídos da modernidade, separados por um sistema de apartheid social, a apartação, devido a desigualdade abismal no acesso à educação.
Depois de um século de frustrações com as revoluções prisioneiras das economias nacionais, que utilizaram o poder do Estado para criar novas classes burocráticas por meio do desenvolvimentismo ou do socialismo, e no início de um novo século no qual o mundo se divide internacionalmente entre um Primeiro-Mundo-Internacional-dos-Ricos, seja qual for o país onde se vive, e um Arquipélago-Social-de-Pobres espalhados no Planeta - o gulag neoliberal - o ponto de partida da utopia é derrubar a Cortina de Ouro que separa incluídos e excluídos dentro de cada país, quebrar a apartação e integrar a todos, dando- lhes a mesma chance. O crescimento econômico não será capaz, a revolução social tradicional pela economia e controle do estado não será possível. O caminho é a educação.
Isso, obviamente, não significará o coroamento do projeto civilizatório. É um passo revolucionário, mas apenas um primeiro passo. O futuro distante pode ser apenas sugerido como uma idéia, não uma proposta: no lugar da sonhada e fracassada igualdade na renda e no consumo com o sacrifício da liberdade, proposta nos séculos XIX e XX, agora a utopia sonhada pode ser a humanidade livre e integrada globalmente. Uma humanidade conectada, dispondo dos equipamentos e das bases culturais para o grande diálogo mundial que os diversos meios de comunicação já permitem. Hoje, o papel da Nossa Causa é dar uma pequena contribuição: fazer com que os brasileiros estejam todos integrados, e com a mesma chance de participar.


Quanto custa não fazer
No começo dos anos 1960, a Coréia tinha renda per capita da ordem de US$ 900 e o Brasil, de US$ 1.800, o dobro. Neste começo de século 21, a renda do Brasil encontra-se por volta dos US$ 8 mil (corrigida pela paridade de compra) e a da Coréia é que se tornou o dobro da nossa (cerca de US$ 16 mil).
Os coreanos multiplicaram por 18 sua renda per capita, enquanto nós a multiplicamos por 4,5.
A opinião geral é de que isso aconteceu, principalmente, porque os coreanos fizeram uma revolução na educação, e nós não. Caso a tivéssemos feito, poderíamos ter hoje uma renda per capita em torno de US$ 32 mil. Quase quatro vezes maior. Perdemos, cada brasileiro, cerca de US$ 24 mil anuais. Nosso PIB seria de quase US$ 3 trilhões, em vez de menos de US$ 1 trilhão.
A falta de uma revolução na educação vai continuar a produzir um alto custo anual em termos de violência no Brasil, estimado entre R$ 80 bilhões e R$ 200 bilhões, conforme a fonte; e de pelo menos outros R$ 9 bilhões em Bolsa Família para 40 milhões de pessoas.
Para não falar do custo moral da vergonha por causa da desigualdade, da pobreza.
E ainda haverá o custo de um Brasil definitivamente para trás no cenário das nações, perdida a chance de participar da atual revolução científica e tecnológica em marcha no mundo.
O custo de não fazermos a revolução educacional e não tomarmos as demais medidas aqui propostas é a perda do Brasil, seu esgarçamento como nação moderna, pacífica, eficiente, com igualdade de oportunidade, criadora de riquezas materiais para todos os brasileiros e, sobretudo, de riqueza intelectual, científica, tecnológica e cultural para toda a humanidade.
É um custo da omissão que a geração atual não tem o direito de permitir. Porque ainda é possível reorientar o futuro do Brasil, com uma revolução pela educação, como fez a Coréia.

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