quarta-feira, 13 de abril de 2011

A barbárie de cada um de nós

Oscarino Arantes

“Quando uma sociedade deixa matar crianças é porque começou seu suicídio como sociedade.” – Herbert José de Sousa (Betinho)

Relutei em comentar sobre o que aconteceu no Colégio em Realengo. A estupidez do fato fala por si e exige de cada um a reflexão obtemperada pela perplexidade e pela dor. Mas mudei de idéia diante da enxurrada de abordagens da mídia, sempre sequiosa por apelos trágicos, que mobilizam a chamada “opinião pública”, eufemismo de uma sociedade que raramente tem alguma opinião. A tristeza é verdadeira, mas sua reiterada abordagem superficial superexcita o emocional popular com matérias apelativas. Não faltam os oportunismos de plantão: autoridades desfilam na frente das câmeras certas de que, pelo menos desta vez, não há imputação de responsabilidades. Soluções mirabolantes são discutidas. No Senado, Sarney e Cia. reeditam o plebiscito do desarmamento, nas sombras da comoção que a tragédia causou.

Será mesmo que o que ocorreu em Realengo é um “caso isolado”? Não estou sugerindo um padrão, mas questiono se nossa sociedade de valores invertidos, não carrega em si o gérmen da violência. Sem dúvida que a violência sempre esteve presente na História, como um traço significativo de cada formação social. Mas uma violência sem sentido, desprovida de razão ou propósito, só é possível numa sociedade de relações alienadas, desprovidas de valores, massificada e submergida num individualismo sem individualidade. A violência sem sentido se reproduz em todas as manifestações da vida moderna, da música à religião, a agressividade e o alheamento em relação ao outro, conforma o uso da força como um fenômeno típico-cotidiano, insensível, gratuito e brutal.

O que esperar de uma sociedade que não valoriza a educação e a cultura em seus grandes meios de comunicação, mas se contenta com o infindável desfile de banalidades, idiotices e apelos sensuais. Uma indústria midiática de imbecilidades que produz “celebridades” e “sucessos” em escala, sempre na lógica do quanto mais escatológico melhor. Ao infindável desfile de bizarrices que hoje resume a nossa produção cultural de massa, segue-se uma cidadania reduzida ao patamar de consumidor. Você é avaliado pela sua capacidade de consumo. Não importa mais ser um cidadão, importa ser consumidor.

Que valores hoje reproduzimos como nação e sociedade? O “ter” prevalece sobre o “ser”, o “fácil” se impõe ao que é “certo”. Distorções que tentamos corrigir criando mais distorções. E de nada adianta profligarmos decretos e leis mais duras, para reprimir conseqüências, se como sociedade não decidirmos combater a causa profunda, que é a nossa própria perda de referencial como sociedade, gerando a violência onipresente nas estradas, nas famílias, no trabalho, nas ruas... nas escolas. Há um estranhamento da pessoa que não se vê no outro, nem se identifica na sociedade em que vive. Em Realengo, o assassino era um jovem que se inspirou nos terroristas por absoluta falta de outra inspiração que pudesse lhe direcionar a existência vazia. Quantos outros assim existem? Uma vida sem propósito e uma morte sem sentido. É isso que oferecemos aos nossos jovens.

Nenhum comentário: