quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

América Latina segue iniciativa do Brasil e reconhece o Estado palestino com as fronteiras de 1967


Um Estado palestino com as fronteiras de 1967

Enquanto os países latino-americanos seguem o caminho indicado pelo Brasil, de reconhecer o Estado palestino independente das fronteiras de 1967, Israel dá as costas ao mundo, intensifica construções ilegais na Cisjordânia e reforça os laços militares com os EUA

Por Niko Schvarz

Há alguns dias (23 de dezembro) o chanceler Luis Almagro e o subsecretário Roberto Conde animaram um debate sobre um balanço da gestão do Ministério, na presença de parlamentares das comissões de Assuntos Internacionais do Parlasul, de diretores de assuntos internacionais dos ministérios e de dirigentes da Frente Ampla, da Comissão de Relações Internacionais da Frente Ampla e de outros setores da sociedade, e deram origem a uma troca de opiniões viva e franca em um tema que, segundo o ânimo coletivo, vai se ampliar. Uma conclusão primária é que a chancelaria realizou um trabalho intenso e eficaz, que se desdobrará em múltiplas iniciativas em 2011, e que será conveniente adotar medidas para que estas atividades cheguem ao conhecimento das pessoas comuns.

Um dos temas que esteve sobre a mesa foi o reconhecimento do Estado palestino, que o governo assumirá o compromisso de tornar concreto no início de 2011. Será discutido se este reconhecimento, que contará com um apoio generalizado, deve realizar-se (ou não) na base das fronteiras anteriores a junho de 1967.

A resposta deve ser afirmativa, em minha opinião, e o problema das fronteiras não pode ficar no limbo. Assim o fizeram os países latino-americanos que, em rápida sucessão, estão se incorporando ao reconhecimento do Estado palestino, como já o fizeram uma centena de países em todos os continentes. Isso foi expresso na carta do presidente Lula ao presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmud Abbas, em 3 de dezembro. O comunicado oficial do Ministério de Relações Exteriores da República Argentina, em 6 de dezembro, diz: a presidente da Nação Argentina, Cristina Fernandez de Kirchner, enviará uma nota ao presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmud Abbas, pela qual lhe comunicará que o governo argentino reconhece a Palestina como um estado livre e independente, dentro das fronteiras existentes em 1967. De imediato, sobreveio o anúncio uruguaio e o do presidente Evo Morales, da Bolívia. Em 25 de dezembro os telegramas informaram que o presidente equatoriano Rafael Correa vai assinar também o reconhecimento oficial do Equador ao Estado palestino como livre e independente, com suas fronteiras de 1967, segundo comunicou o presidente a Mahmud Abbas e o embaixador equatoriano na ONU ao seu colega palestino.

O fluxo continua. Chile e México estão avaliando adotar atitude semelhante. No caso do Chile, o chanceler Alfredo Moreno confirmou (dia 23) que o presidente Sebastian Piñera se reunirá com o líder palestino Mahmud Abbas em 1º de janeiro em Brasília, durante a posse de Dilma Rousseff.

Ao mesmo tempo, dez países da União Europeia anunciaram que a elevação do nível de suas relações diplomáticas com a Autoridade Nacional Palestina (ANP) poderá ter lugar nas próximas semanas. Os países europeus que mantêm contato com a ANP, nesse sentido, são Alemanha, Reino Unido, Bélgica, Suécia, Finlândia, Dinamarca, Áustria, Luxemburgo e Malta. Espanha e França o fizeram anteriormente. No mesmo dia em que Lula anunciou sua decisão (3 de dezembro) o chefe da missão palestina na França apresentou suas credenciais ao presidente Nicolas Sarkozy em presença da ministra de Relações Exteriores Michele Alliot-Marie em uma cerimônia inédita que mostra a elevação do estatuto da representação palestina na França, decidida em julho, segundo se informa. O presidente Dimitri Medvedev fez o mesmo em nome da Federação Russa.

Fontes diplomáticas israelenses citadas por La Vanguardia, de Barcelona, expressaram o temor de que esta onda de apoio à Palestina procedente da América Latina se converta em um tsunami diplomático global e irreversível. Depois que se apagaram as chamas do trágico incêndio do Monte Carmelo, o diretor geral da chancelaria israelense, Rafael Barak, enviou (dia 20), um telegrama urgente às embaixadas israelenses recomendando que façam todos os esforços para boicotar as tentativas do governo de Ramalah de obter um reconhecimento.

Previamente, o vice-chanceler israelense, Daniel Ayalon, havia condenado em termos agressivos a conduta de Brasil, Argentina e Uruguai sobre esta questão, além de cobrir de impropérios o presidente Hugo Chávez. O chanceler Avigdor Lieberman é um partidário extremado da continuação sem limites das construções israelenses em território palestino.

O fato é que enquanto o diálogo palestino-israelense está paralisado, as novas construções e colônias israelenses na Cisjordânia e em Jerusalém oriental se multiplicam. A lista é muito extensa e é acompanhada da destruição de casas habitadas por palestinos, para entregá-las a ocupantes israelenses. Além disso, telegramas do dia 21 noticiaram a destruição de moradias e pequenos comércios palestinos no bairro de Issaweya em Jerusalém oriental, de uma pequena gráfica reduzida a uma pilha de escombros e metais retorcidos. Vê-se também o espancamento de garotos palestinos na mesma região. A ONU critica Israel por estas práticas e o acusa de ignorar os apelos do Quarteto (ONU, União Europeia, Rússia e EUA) para deter a construção de colônias em terras palestinas, inclusive Jerusalém oriental (declarações do coordenador especial da ONU para a região, Robert Serry, divulgadas pelo porta-voz oficial da organização, Martin Nesirky).

O governo dos EUA solicitou de Israel uma breve moratória nas construções após o vencimento, em setembro, do prazo estabelecido anteriormente, e recebeu uma negativa contundente de Netanyahu. A posição de Israel não mudou nem mesmo quando o governo dos EUA lhe ofereceu, em troca, um pacote considerável de incentivos, que incluía 20 aviões de combate F-35 supermodernos, insumos para as Forças Armadas israelenses, 205 milhões de dólares para comprar sistemas de defesa antiaérea, um aumento significativo dos programas de capacitação militar, além da promessa de vetar, no Conselho de Segurança da ONU, toda resolução contra Israel e toda tentativa da ANP de promover a criação do Estado palestino. E enquanto as construções ilegais israelenses intensificam seu ritmo, em surdina o secretário de Defesa de Israel, Ehud Barak e o chefe do Pentágono, combinaram em Washington os termos de novos acordos militares.
Acrescente-se a tudo isto que um conjunto de personalidades europeias levará uma documentada nota sobre este tema à Presidência do Conselho Europeu que, por sua importância, examinaremos em separado.

Fonte: La República, 27 de dezembro de 2010

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