domingo, 20 de julho de 2014

O Homem virtualizado: espanto e êxtase de uma nova era

 

Por Oscarino Arantes

A cada dia novas tecnologias reinventam um cotidiano tangenciado pelo desconcerto de sua assimilação. Inovações sucessivas que ditam seguidas mudanças reverberam em atitudes que se furtam à abstração de valores. Sem dúvida a internet é a mais surpreendente mudança já introduzida na humanidade e rapidamente se tornou campo de negócios, ciência, cultura, relações sociais, política, guerra eletrônica, espionagem, contrainformação, sabotagem, fraudes, crimes e até de terrorismo. Se por um lado universalizou a informação, por outro, subsumiu o sujeito a dados desse universo virtualizado. Ainda é cedo para avaliarmos todas as consequências, porém, já podemos observar que o excesso de informações de múltiplas fontes em permanente acréscimo, longe de possibilitar a formação de um senso crítico indispensável à práxis do indivíduo, causa-lhe dúvida e extasia. A quantidade não assegura qualidade e, assim, em certo sentido, o homo conectatus está desconexo.

Nas redes sociais, novas formas de relação criam uma nova arquitetura social. Nessas redes o indivíduo projeta uma identidade narcísica, que decompõe sua privacidade e, com isso, a referência de sua própria individualidade. Com a avidez de se expor na rede social, o indivíduo busca se afirmar como protagonista de um cotidiano idealizado na presunção de popularidade. Tenta decompor sua solidão imanente com a perpetuação do instantâneo difundido. Assim, o paradigma da relação deixa de ser o outro, sem face, desumanizado por sua multiplicidade, e passa a ser a própria plataforma, sob a qual o indivíduo reconstrói sua ética. Ocorre que nessa pantomima todos se fazem protagonistas e o intercâmbio deriva para o burlesco da intimidade compartilhada ou para frivolidades do dia a dia. Não me parece ter sido isso que Andy Warhol pensou quando disse que "um dia, todos terão direito a 15 minutos de fama".

Vemos que a cada dia fica mais difícil delimitar as fronteiras do real e do virtual. Em pouco tempo provavelmente isso se tornará impossível. Não se trata mais de uma rede de intercâmbio e comunicação, reprodutora de realidade, mas de uma nova forma de realidade, que expande e redimensiona constantemente o conhecimento e desafia os modelos de nosso próprio pensamento. Novos parâmetros recriam a linguagem e até uma física própria, onde o referencial espaço-tempo se funde e se confunde em nosso devir. Entre o real e o virtual não temos mais espaço para a dúvida.

O cotidiano do homem foi invadido pelo ritmo surpreendente das inovações. Invadido e definitivamente transformado. Não há tempo para surpresa ou ponderação, somos passageiros de um avião perdendo altitude, sorrindo e torcendo para que alguém ainda esteja no comando. Por toda a história humana as inovações foram introduzidas no ritmo ditado por sua assimilação. Hoje, somos atropelados pelas inovações. Pela primeira vez na história, a identidade transcende o indivíduo. Como nos relacionamos e até quem somos é redefinido no universo virtual, que se torna cada vez mais espaço vital. Sem dúvida que a internet veio pra ficar, é um marco civilizatório de nossa era. Mas a impassividade diante de suas consequências é algo preocupante, considerando os desafios prementes da humanidade.


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