Por Guilherme C. Delgado
A última reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central
manteve a taxa básica de juros em 7,25% ao ano, mas a orquestração do setor
financeiro pela sua elevação continuou, em nome de presumidas pressões
inflacionárias que a economia enfrentaria por todo o ano de 2013. Essas
pressões para elevar juros se apresentam com base em dois argumentos distintos:
1) de que há tensões inflacionárias reais em perspectiva; 2) de que essas
tensões devem ser combatidas pela elevação dos juros internos.
A primeira proposição tem certa dose de realidade, mas não se deduza
daí que esta corrobora a segunda, como se verá pela argumentação subsequente.
Os preços das “commodities”, componentes de um filão importante dos
alimentos da “cesta básica” – milho, soja, carnes (bovina, suína e de aves),
açúcar e trigo –, experimentam pressões conjunturais externas. Como estes
produtos são mercadorias importantes na pauta brasileira de exportáveis (milho,
soja, carnes e açúcar) e de importação (trigo), pode-se prever um certo choque
de preços por esta via, suscetível de impactar os Índices de Preços ao
Consumidor em no máximo um ou dois pontos percentuais no ano, acima do patamar
da inflação acumulada em 12 meses – ao redor dos 6,2%. Mas essa pressão externa
conjuntural, se ocorrer na magnitude indicada, não poderia ser revertida pela
elevação da taxa de juros determinada pelo Banco Central (a SELIC), cuja
eficácia no corte da demanda interna de bens de alimentação é limitada; e
praticamente não é eficaz para conter a demanda externa – das exportações de
“commodities”.
Outras políticas podem ser acionadas, que não a elevação dos juros. O
governo anunciou mais um pacote de desonerações, de alimentos da cesta básica,
remédio de caráter estrutural, que aparentemente também estaria sendo aviado
para conter as pressões das “commodities”.
Por sua vez, há na área dos estoques públicos de alimentos alguns
arranjos em cogitação, tendo em vista recompor certas funções de coordenação de
intercâmbio dos preços internos, que a política agrícola perdeu desde meados
dos anos 90, com a desmontagem do sistema dos Preços de Intervenção no mercado
atacadista. O fim da inflação elevada depois do Plano Real deixou a política
antiinflacionária estritamente sob controle do Banco Central, mas não dos
fatores estruturais que ainda provocam inflação.
Em síntese, tensões inflacionárias potenciais sobre os preços da cesta
básica existem de fato. A nossa inserção externa, com forte “primarização” do
comércio exterior, força-nos a importar as pressões externas dos preços das
“commodities” sobre componentes relevantes da cesta básica oriundos da
agricultura. Isto se dá independentemente da escassez interna desses produtos.
Nem sempre essas tensões são altistas. Quando for o caso, certamente não será com
política de juros altos que tais pressões serão neutralizadas.
Por outro lado, mantido o ritmo de crescimento da demanda interna em
razão da evolução de massa salarial e dos rendimentos vinculados à política
social, que é o que se espera com crescimento na faixa dos 4% a 5% ao ano,
haverá certamente pressões para uma oferta diversificada e policultural de
produtos agropecuários, cuja melhor política seria de fomento econômico aos
setores mais vocacionados para tal resposta – a produção familiar e da pequena
propriedade.
A orquestração pela subida dos juros e as pautas de política agrícola
totalmente voltadas à economia do agronegócio não resolvem as pressões
inflacionárias oriundas do setor primário, até porque são parte de um problema
maior e não de sua solução.
Guilherme Costa Delgado é doutor
em economia pela UNICAMP e consultor da Comissão Brasileira de Justiça e Paz
Fonte: Correio da Cidadania
Nenhum comentário:
Postar um comentário