Por Luiz Eça
Quando os palestinos
buscaram na ONU o reconhecimento de sua independência, os EUA vetaram.
Determinaram que a
independência da Palestina só poderia ser conseguida através de negociações
diretas ente as partes.
Contra a opinião do
Hamas, o Fatah, que administra parte da Cisjordânia, dobrou-se ao diktat de Tio
Sam.
Pressionado por Obama,
desistiu de exigir uma parada na expansão de novos assentamentos judaicos como
pré-condição para iniciar conversações com os israelenses.
Há poucos dias do fim
do prazo para se chegar a um acordo, não se chegou a nada.
Durante os nove meses
de discussões, Netanyahu bateu o recorde na criação de novos assentamentos e,
por fim, deixou de libertar o último grupo de 104 prisioneiros, como havia
prometido.
Enquanto isso, Abbas,
chefe do Fatah e da Autoridade Palestina, limitou-se a protestar e denunciar as
transgressões de Netanyahu.
O máximo que ousou
foi, depois da negativa dos israelenses em libertar os prisioneiros, assinar 15
convenções internacionais como um país livre.
De repente, os ventos
mudaram: em vez de se deixar levar pelos manejos da Casa Branca, ele se voltou
para os dirigentes do Hamas, até então totalmente excluídos das negociações de
paz.
E os dois movimentos
fizeram as pazes – brigados desde 2006, quando o Hamas ganhou as eleições
parlamentares palestinas. A partir daí, o Fatah permaneceu na Cisjordânia,
administrando parte da região através da Autoridade Palestina. Enquanto o Hamas
ficou governando o Estreito de Gaza.
Rivais durante oito
anos, Fatah e Hamas proclamaram o óbvio: que o verdadeiro adversário é Israel.
Em cinco semanas, irão
formar um ministério de unidade, seguindo-se eleições de um novo parlamento,
nove meses depois.
Tanto os governos de
Israel quanto dos EUA apressaram-se em condenar o reatamento.
Para Netanyahu, os
palestinos tinham de escolher entre a unificação e a paz. Com a opção que
fizeram, a paz estaria morta.
Na verdade, já estava.
Ninguém esperava que até o prazo final de 29 de abril surgisse uma solução
mágica.
Para alguns analistas
israelenses, aconteceu exatamente o contrário: longe de ser destrutiva, a
participação dos dirigentes de Gaza nas reuniões era indispensável para que um
possível acordo incluísse todos os palestinos, não somente os liderados pelo
Fatah.
As razões do veto do
premier de Israel e dos EUA às negociações com representantes dos movimentos
unificados resumem-se a duas:
a) O Hamas é um
movimento terrorista;
b) O Hamas não aceita
a existência de Israel e defende a luta armada contra a ocupação.
A verdade é que o
Hamas abandonou o terrorismo há muitos anos.
Além disso, depois da
última trégua com Israel, deixou de lançar mísseis contra o território do seu
vizinho. Chegou a criar uma força especial para tentar evitar que outros grupos
revolucionários partissem para esse recurso inócuo (embora muitas vezes não
consiga). Os raros ataques lançados pelo Hamas são em resposta a ataques
anteriores de Israel.
Quanto ao
não-reconhecimento de Israel pelo Hamas, convém lembrar que Israel, por sua
vez, também não reconhece a Palestina como Estado. Fez o maior escândalo quando
Abbas pleiteou o ingresso da nação palestina na ONU como Estado-membro.
De qualquer modo,
assim como existem vários ministros de Netanyahu contrários à independência da
Palestina, ele não tem direito de reclamar que, no futuro ministério da aliança
Hamas-Fatah, haja quem não reconheça Israel.
Mesmo assim, acredito
que os dirigentes do Hamas vão deixar claro que não se opõem à existência do
Estado de Israel.
Não sei se EUA e
Israel se contentarão com isso. Há razões não expressas que pesam mais nas
rejeições à aliança do Fatah com o Hamas. Juntos, eles ficam mais fortes para
lidar com a agressividade de Israel.
E menos dependentes
dos favores e humores de Obama. Apesar da ruptura no processo de paz causada
pela unificação dos movimentos palestinos, Abbas insiste em buscar uma solução
negociada.
Ele defende um
prolongamento das negociações desde que sejam satisfeitas algumas condições:
- libertação do último
grupo de prisioneiros;
- dedicar os próximos
três meses à discussão das fronteiras dos dois Estados;
- paralisação da
criação de novos assentamentos.
Muito razoável. A
libertação dos prisioneiros já era um compromisso assumido por Israel.
A questão das
fronteiras, por envolver a possível troca de territórios de assentamentos por
territórios em Israel, é absolutamente fundamental. Resolvida, representará um
sinal verde para a solução dos dois Estados.
Quanto aos
assentamentos, até Obama, no seu primeiro governo, considerou essencial que
fossem interrompidos.
Caso Israel dê o
contra, Abbas já disse o que fará: deve entregar a chave da Autoridade
Palestina a Netanyahu.
Passará a
administração para ele dizendo algo assim: “Aqui está a autoridade, vocês
esvaziaram completamente seu conteúdo. Fique com ela”.
Netanyahu e seus
principais aderentes afirmaram que não se preocupam nem um pouco com as
declarações de Abbas. Pois deviam.
Como potência ocupante
da Cisjordânia, Israel seria obrigado a prestar serviços de saúde, educação e
segurança aos 2,5 milhões de habitantes da região.
O que custaria uma
grande soma de recursos inesperadamente adicionados ao orçamento de Tel-aviv.
Além disso, o
isolamento internacional de Israel ficaria ainda maior – fornecendo abundante
munição ao movimento pelo boicote dos produtos israelenses em todo o planeta.
Sem contar que, caso
não atendesse às suas novas obrigações para com os palestinos, poderia sofrer
sanções, se não da ONU (os EUA provavelmente bloqueariam), pelo menos dos
países da Europa, já irritados com as violências e violações israelenses.
Os EUA reagiram à
ameaça de Abbas de fechar a Autoridade Palestina, anunciando cortes de
subsídios a ela.
Totalmente inócuo,
pois, não havendo mais Autoridade Palestina, não haverá a quem Tio Sam possa
negar seus dólares.
Retaliação muito mais
forte viria de Israel, que está acostumado a impor seus pontos de vista com
desusada audácia e agressividade.
Os dirigentes
palestinos estão conscientes disso, terão previsto como se defender.
Alguns observadores
palestinos atribuem a surpreendente coragem do até agora fraco e submisso Abbas
à sua idade avançada. Como não se recandidatará à presidência, quer deixar uma
herança gloriosa.
Porém, a explicação
parece residir naquele velho e batido chavão: “a união faz a força”.
Luiz Eça é jornalista
e colunista do Correio da Cidadania.
Website:
www.olharomundo.com.br
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