Por Pablo Ortellado
A cada dia que passa,
recebemos notícias mais graves da suspensão dos direitos civis no Brasil. Desde
a semana da abertura da Copa, quase todas as manifestações públicas programadas
foram dissolvidas preventivamente, ou seja, foram impedidas por força policial
de se concentrarem, numa flagrante violação da Constituição.
Centenas de ativistas
em todo o território nacional estão sendo regularmente visitados de maneira
intimidatória pela polícia, que também os está intimando a depor
coercitivamente durante datas de manifestação com o intuito de privá-los de um
direito que deveria ser sagrado em qualquer democracia. Até a Polícia Federal
está fazendo uso da infame Lei de Segurança Nacional, um dos mais abjetos
resquícios da ditadura militar. Tudo isso para que um torneio de futebol ocorra
"sem transtornos".
Todos os níveis de
governo, os meios de comunicação de massa, o judiciário e a esquerda aliada ao
governo federal estão se calando contra as gravíssimas violações aos direitos
civis. Oficialmente, 50 mil famílias foram removidas de suas residências para
que a Copa acontecesse por aqui – estamos falando de 200 mil pessoas, um em
cada mil brasileiros. Boa parte foi mandada para longe – alguns não foram
indenizados e a maioria contesta o valor da indenização. Por outro lado, a FIFA
e seus parceiros comerciais receberam mais de um bilhão de reais de isenção
tributária, valor que permitiria aumentar em 20 mil reais a indenização para
cada uma das famílias "oficialmente" removidas.
O movimento que
protesta contra a Copa fez uma porção de erros estratégicos e não conseguiu
organizar a insatisfação. Mas nada, absolutamente nada, justifica o que está
acontecendo e a conivência das nossas instituições.
Um pequeno grupo de
vozes dissidentes que inclui ativistas, movimentos sociais e organizações de
direitos humanos segue isolado e falando para as paredes, enquanto a direita, a
maior parte da esquerda e quase todas as instituições democráticas fingem que
nada acontece. A única coisa que oferece consolo é que a imprensa
internacional, ao contrário da brasileira, está minimamente fazendo seu papel e
tem produzido boas análises críticas da FIFA (afinal, verdade seja dita, a
submissão do Brasil à FIFA nada tem de excepcional).
Se sairmos desse
episódio com um crescimento da consciência crítica do papel desse monstro
privado transnacional, talvez os sacrifícios não tenham sido em vão. Mas talvez
nossa oposição não tenha tido força ou organização suficiente para tanto.
Hoje, queria mesmo era
estar me divertindo com o meu filho, como meus pais fizeram comigo em 1982. Mas
não estou conseguindo separar o futebol de tudo isso que está acontecendo. É
uma pena.
Fonte: Correio da Cidadania
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