Sociólogo
sustenta: novos movimentos pensam a longo prazo, querem transformar relações de
poder e são alternativa ao populismo de direita
Por Manuel Castells, no
The Guardian | Transcrição e tradução: Gabriela Leite
Estamos testemunhando o aparecimento de um novo tipo de
movimento social, que ainda é embrionário, por isso ainda não foi capaz de
alterar fundamentalmente a política. Mas foi assim em muitos momentos da
História. Este pode ser o começo de um longo processo de mobilização.
O que caracteriza todos estes movimentos é que, por um
lado, são sempre criados na internet, aproveitando-se da autonomia do
ciberespaço para promover debates e interagir. Mas passam frequentemente, no
momento seguinte, ao espaço urbano — e constroem redes sociais físicas de
interação. A combinação do ciberespaço e do espaço público com alguma
contestação ao sistema institucional é o que caracteriza estes movimentos. Eles
aparecem e desaparecem. E estão sempre na internet. Eu chamo suas dinâmicas de
rizomáticas.
Nos últimos tempos, vemos, particularmente na Europa, o
surgimento de alguns esforços para exercer influência sobre o próprio sistema
político. Sempre que há uma nova eleição, aparecem novas formas de expressão
política, com as quais não necessariamente concordo ou apoio, mas estão
mostrando um claro descontentamento com sistema político.
O padrão comum fundamental é o uso da internet, a
ocupação do espaço urbano (mas não apenas) e a possibilidade de recriar uma
nova forma de representação democrática. Por fim, estes movimentos não tratam
de causas específicas que estão relacionadas apenas com seu próprio país. São,
até certo ponto, iguais em seu objetivo, que é reconstruir a democracia de
baixo para cima.
O que muitas pessoas se perguntam é “então, qual é o
resultado desses movimentos?” Para a maioria dos participantes dos movimentos,
eles estão começando um processo. Isso é o que dizem: que precisamos fugir da
lógica produtivista do capitalismo. Eles acreditam que há um novo processo de
crescimento de consciência e mobilização das pessoas. Os movimentos estão
encorajando as pessoas a acreditar que não precisam necessariamente delegar seu
poder aos políticos e seu dinheiro aos bancos, em que não confiam. Estamos em
um ponto em que a falta de confiança é esmagadora. Então, surge a noção de que
as pessoas estão sendo empoderadas por estes movimentos — e não apenas as que
participam diretamente deles. Em países como a Espanha, 70% da população apoia
os movimentos, apesar de pensar que eles não podem mudar nada a curto prazo.
Então esta é a primeira coisa, os movimentos tem que ampliar a consciência e
estimular o empoderamento das pessoas.
É possível, até agora, alguns exemplos de impacto dos
movimentos sobre a política. É o caso da Islândia. Lá, a sociedade inteira
envolveu-se, via internet, na redação de uma nova Constituição. Os bancos foram
nacionalizados e depois reprivatizados sem favores; o país preservou direitos e
vai muito bem. Bem, é um país pequeno, mas o Chipre também é. Um é exemplo dos
impactos negativos da crise; o outro, de como, a partir da crise, pode-se
transformar o sistema político e resgatar a democracia e a sociedade. É assim
que pensam, atualmente, as pessoas que participam dos movimentos. Veem-se
plantando a semente do que será, em algum momento, uma transformação inclusive
das relações de poder e das relações sociais.
A alternativa é a emergência de movimentos populistas de
direita. Isso está particularmente claro na Finlândia, na Grécia e mesmo no
Reino Unido. Por isso, os novos movimentos têm também o papel de canalizar o
protesto popular para sentimentos positivos e esperança, ao invés das atitudes
reacionárias e destrutivas do nacionalismo xenófobo.
Fonte:
Outras Palavras
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