Oscarino Arantes
"Os partidos políticos existem para alcançar o
poder."
(Ulysses Guimarães)
Objetivamente,
a razão de ser de um partido político é chegar ao poder. Todo o sentido de sua
criação, todo o propósito de sua existência, sua organização e ação política, é
voltada para esse objetivo. Pela via institucional numa democracia, a chegada
ao poder, aqui compreendido como o governo central, ocorre por meio de eleição.
Daí a importância fundamental da alternância democrática, ou princípio da
alternância do poder. Isso porque, ao contrário do senso comum, a democracia
não é apenas a vontade da maioria prevalecendo sobre a minoria. É também um
conjunto de princípios e valores que ajudam a construir o referencial de uma
ordem democrática: estado de direito, estabilidade das regras, respeito às
minorias, livre manifestação de pensamento, divisão e autonomia dos poderes,
entre outros.
É
nesse sentido que faz parte da essência da própria democracia a alternância do
poder, que permite um equilíbrio entre as forças políticas instaladas no
governo e aquelas que lhe fazem oposição, contribuindo para a renovação
política. Sem ela consolidam-se práticas autocráticas, personalismo, desvios
éticos, a confusão entre partido e governo, o enfraquecimento da oposição, o
esvaziamento do debate ideopolítico e o desprestígio da própria democracia.
Em
um país com partidos fracos, práticas oligárquicas, população despolitizada e
instituições em consolidação, a reeleição introduzida com a EC nº 16 de
04/06/1997 foi um aleijão em nossa democracia, alterando o equilíbrio entre situação
e oposição. Esvaziou, por assim dizer, a fluência de uma perspectiva real de
poder. Na época, na esteira da estabilização econômica do Plano Real, foram
“vendidas” para a sociedade brasileira as idéias vinculadas de governabilidade
e continuísmo, como fianças da estabilidade macroeconômica. Na verdade
buscava-se afastar o elemento imponderável do processo eleitoral, dando-lhe
previsibilidade, exigência dos “investidores”. Hoje, pagamos o preço do
casuísmo de FHC.
Sem
a reeleição, a eleição geral em quatro em quatro anos permitia a contínua retomada
do projeto eleitoral partidário, com o aproveitamento da estrutura anterior,
rearranjo de alianças, novas propostas e novos embates, numa dinâmica que, se
não era perfeita, mantinha em aberto a possibilidade de aperfeiçoamento. Com a
reeleição, esvaiu-se a perspectiva real de poder e o quadriênio passou a ser
mero referendo do continuísmo. Acontece que o ciclo de oito anos é longo demais
para manter alianças e propostas no campo da oposição. A base governista se
amplia e absorve a oposição ou lhe esvazia. Para acomodar tantos partidos, o
governo partilha a máquina do estado por critério quantitativo e o fisiologismo
toma a linha de frente na política governista. Ao término do ciclo de oito anos,
a relação de forças políticas está tão alterada que dificilmente a situação não
conseguirá se perpetuar no poder.
O fim da reeleição a
meu ver é interesse fundamental de toda sociedade. Nota de fundo da atual crise
de nossa democracia, a falência institucional dos partidos políticos não é
causa, mas sim conseqüência de um sistema político que precisa ser reformado.
Dilma chegou a falar do assunto quando assumiu o governo, mas depois abandonou
a idéia e sequer esboçou uma tentativa de levar adiante a proposta de reforma
política, conformando-se com o modelo governamental herdado. Ficará na História
como a estudante que pegou em armas contra a ditadura e a presidente que não
soube defender a democracia.
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